Faz algumas semanas que vi trechos da entrevista de Wagner Moura para um podcast. Numa passagem ele conta que era apelidado de ovni quando adolescente, e que quando começou a fazer teatro ele encontrou a “sua galera”. Eu me lembrei disso agora, porque estou na recepção da aula de teatro da minha filha enquanto leio um livro. De vez em quando, levanto os olhos para responder ao bom dia de outra criança entrando para a aula. Peguei meu celular para escrever isso, porque tive uma sensação gostosa de paz. Todas as crianças me olham e a saudação matinal sai acompanhada de leve sorriso, ou mãos animadas dando tchau de pertinho, ou olhinhos que dizem “conheço, é a mãe de Suaila”.
Bom, lembrei de mim na infância, intensa demais, verdadeira demais, sentimental demais. Demorou muito e só encontrei mesmo a minha turma de esquisitas no ensino médio, não foi no teatro. Agora, aqui sentada, fico com o coração quentinho, observando que todos os esquisitos dos seus colégios se encontram aqui todo sábado, e juntos não parecem esquisitos. Eles falam a mesma língua.
Que presente saber que minha menina, aos 9 anos, está passando as manhãs de sábado com a turma dela, de gente que se parece com ela na visão artística do mundo, de crianças sensíveis, que falam de coisas delicadas e se entregam aos personagens nessa sala, toda semana. E que certamente passam o texto em casa, as vezes se olhando no espelho, gesticulando, mudando a entonação da voz quando reproduzem falas e tentam imitar o timbre do colega. A minha estava fazendo isso ontem, enquanto eu colocava algumas roupas no armário, ela estava memorizando as aspas da apresentação de hoje. Enquanto estou aqui fora, ouço suas vozes, e os colegas ajudando, apoiando, aplaudindo. Ela apelidou o colégio novo de “mundo hostil”, e aqui, quando entramos na rua do teatro e começamos a ver os colegas que chegam ao mesmo tempo, ela grita cada nome do outro lado da rua e os comprimentos com empolgação, como se não fosse sentar com ela no chão bem de pertinho, em poucos minutos. Ela gosta de estar aqui, e todos os guris aqui são esquisitinhos juntos. Algum alívio para o coração da mãe que está de mudança, mudou a filha de escola, e vive tensa, se esconde para a culpa perseguidora não entrar nela na próxima esquina da vida.
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