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Decoração de fuxico e crochê

Mulher de costas com novelo de lã, TV antiga e plantas ao fundo.
Foto: Miriam Alonso

Recentemente eu descobri que a agonia que vivemos durante o luto, ou o divórcio, pode ser comparada ao caos mental e ao colapso físico que nós experimentamos durante uma mudança domiciliar. Não importa muito a equação! Pode ser de um apartamento para outro, de uma casa para outra, apartamento pequeno para casa grande, fazer uma casa grande caber num apartamento bem menor, ou qualquer outra variação. Quase sempre é um caos! Eu não tenho casa própria, até certa idade minha, os meus pais também moravam de aluguel. Então se somar as vezes que mudamos juntos e as vezes que eu depois de adulta mudei sem eles, perco as contas. Mas nada pode ser tão efeito cobra na vida de uma mulher como uma mudança, é como trocar de pele.

Eu me apaixonei por alguns apartamentos que morei. Mesmo! As vezes passo na frente dos prédios e dou aquele sorrisinho de quem flerta com lembranças gostosas. Mas nunca vivi um conto de fadas, então no meio da nuvem colorida vem aquele bicho dando risada, “coração gelado”(do desenhos os ursinhos carinhosos) e corta como um raio a minha memória, apresentando alguma boa desgraça que rolou naquela moradia. Kkkkkkk

Bom, a verdade é que todo tempo que passei na minha última morada me transformou, e me curei de doenças adquiridas no antigo apartamento e ganhei novos dissabores quando mergulhei profundamente na depressão diante das minhas paredes verde lésbico. Nessa época eu só ficava no quarto, mas depois que voltei a habitar o restante dos cômodos, pude respirar o tanto de vida que eu mesma tinha plantado aqui nesse décimo andar. Era 10 espaços, e eu colori 5 deles. A minha casa viva tinha cores quentes. Aqui me tornei mãe de planta, fiz da minha casa um QG para receber grupos de amigos em diversas ocasiões, amadureci como mãe e mulher, quebrei garrafas de vidro quando quis evitar perder meu réu primário, odiei alguns vizinhos, amei outros, fiz muitos cupcakes para todos os guris que suaila amontoava aqui em casa, dei muitas festas do pijama para as amigas dela. Eu vivi muito, fui completamente eu, entregue e verdadeira na minha essência. Fiz caruru nesse apartamento mais de uma vez, e nessas ocasiões vários vizinhos e porteiros ganharam potinhos com essa comida dos deuses. Eu sou neta de Ana Maria de Alagoinhas, eu sei cozinhar e sempre levo um pedaço para a porta ou para o quintal mais próximo. Aqui eu vi minhas ancestrais através do espelho, descobri e relembrei meus costumes de interior, das coisas que gosto de costurar, as comidas que amo, o sentido que vejo na vida e que aprendi ali, ainda muito menina, no aconchego da minha família. Meu povo é tanto, tem gente de todo tamanho, tem nomes muito diferentes, e ali eu sempre me senti igual, parte, pertencida. Por isso, aonde quer que eu vá, vou recriar o cenário da casa de vó Naná, das frutas que minha tia Iara pintava em panos de prato, dos cheiros de bolos caseiros, do congelador cheio de geladinhos variados. Toda vez que eu fecho os olhos e me pergunto aonde a minha criança era feliz, se sentia amada, cuidada, livre, vem sempre a mesma imagem, Alagoinhas, eu vou reerguer meu interior no meu próximo novo lar.

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