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Foto do escritorAdriele Regine

No meu quadrado meio esfarelado...


Colagem: BaúRevelado (2022) | Adriele Regine

Chegamos no penúltimo mês do ano, menos de 10 dias para o seu final, por hoje temos exaustão. E é sobre isso e mais algumas coisas que quero refletir com vocês.

Estava lendo um chamado de Caroline Amanda | @yonidaspretas (tome nota!), que se somou muito ao que venho sentindo:

Irmãs, ando muiiiito incomodada com as falsas demandas ultra urgentes que temos sido submetidas, sobretudo mulheres. Fazem 3 semanas que 80% da minha bolha tá vendendo curso, workshop de planejamento pra 2023 e eu penso: SERÁ QUE ESTAMOS NO MESMO BRASIL?! GENTCHYYYY!!! O ano foi difícil, arrastado e complexo. Em clínica, muitas pessoas que atendo sentem-se exaustas e muito aquém do que gostariam, não porque não fizeram e conquistaram mas por não enxergarem o TANTO que fizeram em condições absolutamente adversas!

Entro nessa estatística, sim ou com certeza?

E pior, não consigo me projetar para o próximo ano. Não consigo pensar nenhum plano para a próxima hora, imagine para mais 365 dias? A minha volta, parece que todas as pessoas já estão com suas metas para 2023 devidamente organizadas com datas de execução e histórico de progresso. Eu, só quero paz, sombra, água fresca, algum dinheiro para poder fazer isso tudo e sumir do meu quadrado meio esfarelado que insisto em decorar com algumas pitadas de cor.


Eu estou exausta. A ponto de se você me disser que a soma de 10 + 10 é 45, eu direi que você está certíssima (eu li isso e foi a melhor definição para minha estafa!).


Eu sou assim? Não. Mas estou assim, e dentro do meu limite, tenho tentado evitar conflitos (não deu muito certo, mas seguimos, rs). Uma das características que a depressão me deu ou deixou em mim, não sei bem qual seria a expressão, é o silêncio sobre mim. E vou explicar, voltando um pouco no tempo e derramando algumas lágrimas no teclado. Quando eu nem imaginava que poderia estar em um estado depressivo, minha cabeça estava altamente concentrada no que aconteceu. Passava horas relembrando e recontando os momentos, as situações, as expressões de ocasiões que eu tentava escrutinar para achar uma significância, uma entrelinha, um sinal qualquer de esperança. E eu dizia, repetidamente para minhas amigas sobre aquilo, perguntava a opinião delas e repetia perguntas ao longo do dia. Nesse tempo, eu estudava em período integral, então era o dia todo ouvindo a mesma coisa, imagina o martírio para adolescentes que só queriam viver os seus próprios dramas?! Em algum momento, elas começaram a me tirar de tempo, eu comecei a meter os pés pelas mãos criando novos dramas para poder me sentir viva e vibrante como elas e, por fim, me fechei em copas e anos de silêncio e sofrimento se deram em sequência.


Esse silêncio, que permeia muitas mulheres negras, que nunca se dobram as suas dores, essa exaustão, esse descontentamento com suas realizações gigantes, mas que parece nada, é uma herança dura demais. Eu consigo encontrar o exato momento da minha existência em que recolhi em mim tudo o que sentia, hoje posso olhar de volta, sem tanta dor e identificar como naquele momento os ouvidos sensíveis estavam voltados para suas próprias demandas e hormônios. Não foi culpa das minhas amigas meu estado depressivo, não foi culpa de ninguém na verdade, mas se eu já não falava muito das dores que me atravessavam, das inseguranças que me afligiam, no momento em que tudo veio como uma avalanche, uma necessidade de cavar fundo e fundo para uma resposta que eu queria, porém não era a real, fui traída por mim mesma.


O meu silêncio, naquele momento, também foi exaustão, sobretudo por minha cabeça não parar nunca de me levar para o sofrimento. E eu não conseguia dizer... como não consigo agora. Como sigo, fingindo e fazendo coisas para me manter na euforia da vida. Como me coloco em conversas que eu tenho certeza, que não vai dar boa coisa. Como me obrigo a sorrir para as fotos e eventos. Quando eu só queria que alguém pudesse me olhar de verdade, sem a pergunta formal de:

- Como você tá? Seguida da resposta clichê de todos os tempos: - Bem, porém cansada! E trilhar por uma sequência de trabalho, pedidos, demandas, conselhos, acolhimentos para os outros, nunca para mim.


O que me resta, silêncio, no meu quadrado esfarelado... sentido o peso do mundo nos ombros, nenhuma felicidade das realizações e um novo ano batendo na porta sem planos. Talvez isso mude, talvez isso seja só a sobrecarga de quinta ou um sufocamento desconcertante que insistiu em saltar nessas páginas. Talvez, no fim dessas linhas eu esteja mais leve e vocês, aí do outro lado, possa se identificar e perceber que não tá sozinha, como foi comigo ler o chamado da Carol da YONI DAS PRETAS e respirar profundamente com o poema:

Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para diante tudo vai ser diferente.

Roberto Pompeu de Toledo

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