Eu me peguei pensando nisso, porque as vezes sinto dores que nem sei nomear.
Nunca vi minha mãe demonstrar que sentia o mesmo, nem minha avó, nem minhas tias. É estranho, parece que todas as mulheres antes de mim, conhecem o antídoto para não sentir essa dor, mas por algum motivo eu não consigo encontrar a receita.
Enquanto escrevo preciso parar, respirar. O dia é recheado de gatilhos para nossas dores mais íntimas. E eu fico me perguntando, será que elas sabiam disfarçar melhor do que eu?
Mas dizem que sentir a dor é importante para curar a ferida. E eu sigo titubeando nessa verdade, mas precisava mesmo sentir assim, desse jeito tão fundo?
Eu não planejo sentir essas coisas, meu coração acelera porque eu fico desesperada para controlar meus pensamentos e sentimentos. Como se alguém fosse me pegar e me cobrar: "quem disse que você pode sentir alguma coisa, preta?".
Os meus escritos por aqui não poderão sempre falar dos contos leves da infância, porque a minha vida de mulher preta é atravessada por uma montanha russa de silêncios e perdas.
A perda mais sentida foi daquela vez que eu me distanciei de mim, e fui além mar, sozinha, calada, sem remo.
Mas eu ainda sentia o pulsar de dentro, senti calor, e soube que precisava mergulhar. O mar me abraçou como fez tantas vezes, como ainda fará muitas outras.
A água que escorre das lágrimas sem freio, é a mesma que lava e faz você se sentir limpa, nova, purificada.
Essas dores aí citadas, todas sem nome, tiveram vários significados: medo, solidão, saudade, culpa, insegurança, ciúme, e tantos mais.
Me deu vontade de falar sobre a saudade.
Acho que tem muita história escondida nessa palavra.
Tenho a percepção de que eu, mulher negra no mundo, não estou permitida a sentir saudade.
Para camuflar essa proibição, uns dizem "nem é tanto tempo assim", "você é cheia de dengo", "isso é dependência".
Eu acredito que perdemos o direito de sentir saudade quando vimos nossos iguais, irmão, filhos, pais, amigos, amores, sendo levados para lugares tão distantes, que nem era possível imaginar o quanto estariam longe.
Pois na mesma régua, entendemos que não seria possível amar. Porque aí dá vontade de ficar perto, aí dá vontade de sonhar.
E passaram muito tempo ensinando para nossas mulheres que elas não tinham espaço para anseios.
Neste momento, reconhecemos nosso portal para o mundo, e temos cada dia mais força para gestar e parir nosso futuro inédito.
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